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O Amor enquanto sujeito

Foto do escritor: Susan DuarteSusan Duarte

Atualizado: 10 de fev. de 2023

Anuncie a beleza do cotidiano, o ato absolutamente ordinário, nos sinos das catedrais - é ali que o amor acontece.


Para refletir

Muito se diz sobre o amor.

Pouco se conta, porém, acerca de sua natureza verdadeira: como é, onde mora, e especialmente, sobre como reconhecê-lo. Vou contar alguns trechos e memórias soltas sobre onde e quando eu vi, pela vida, este peculiar sujeito - O amor. Gramaticalmente, eu sei, amar é um verbo. Na vida, contudo, de tão procurado que é, o amor já se elevou por conta própria, há séculos, à categoria de sujeito, ainda que a norma culta de nossa língua assim não possa classificá-lo. Com licença poética, proponho, aqui, denominá-lo enquanto sujeito, cujos traços, pistas, cheiros e trejeitos, revelarei nas linhas seguintes.


Pra começo de conversa, a melhor maneira de não encontrar este sujeito, O amor, é procurá-lo. Sujeito peculiar que só, tem a estranha mania de surgir, repentinamente, para os distraídos e ocupados. O amor adora chegar e roubar a cena, as luzes, os holofotes, a atenção de quem, justamente, veja só, não estava à procura dele. Tal fato revela um importante traço deste sujeito - costuma aparecer inesperadamente, pois aprecia a emoção de entrar numa festa, numa vida, para a qual ele não foi convidado. Pensando bem, dessa maneira, ele evidencia o seu jeito supremo de ser - o centro, o cerne, a essência de todos nós. Não há enredo de uma vida, por mais ordenado que seja, que não se altere, para sempre, depois do amor chegar.


Para definir como é o amor, convém também dizer como não é, onde ele não mora. Definir o que não é, o que não está, é outro caminho para investigar la veritá. Eu não vi o amor nas velas, bombons, ursos; nas promessas quebradas, joias, complicações, perfumes, sedas; nas viagens, planos, desistências e jantares em restaurante de toalha branca.


Eu vi o amor no silêncio compartilhado. Eu vi o amor quando um abraço virou lar. Eu vi o amor naqueles olhos verdes. Vi o amor quando desejei uma criança com aquele olhar.


Eu vi o amor no modo como ele me suspendia em seus braços toda vez que me revia, como se não me visse há anos, ainda que tivessem se passado apenas 10 minutos de distância. A distância, aliás, é outra pista que diz muito sobre este sujeito. Ela apaga o amor pequeno; e sabe inflamar o grande.


Eu vi o amor no chá, no pijama, na intimidade. No beijo inesperado. Na porta que bate depois de uma briga, seguido de um clássico, volta aqui, não quis dizer isso. Vi o amor em quem foi embora. Vi o amor em quem voltou, pra ver se havia ali, ainda, aquele amor. Eu vi o amor no modo de fazer rir, encabular, sem jamais ofender.


Eu vi o amor na maneira de dançar. Se sabe que é amor quando os dois dançam no mesmo ritmo, num passo mais natural do que andar. Eu vi o amor entre aqueles que amam as mesmas canções. Igualmente, o vi entre silêncios, nos quais valia a pena habitar, apenas para ouvir a sua sacralidade.


Depois da paixão, do sim, do felizes para sempre, anuncio aos que ainda não amaram que depois, sempre há um depois, não há nada mais afrodisíaco do que insistir, permanecer, errar, acertar e refazer ad infinitum. E nessa dança, perpassar os ciclos de desgaste e progresso, de picos e vales, dos quais nenhum amante e humano escapa.


Onde o amor mora?

Procure pelo absolutamente ordinário. Ele habita nos atos mais comuns - para olhos desatentos, quase imperceptíveis. Deve ser por isso que é tão difícil de encontrá-lo... Na beleza do cotidiano - é ali que o amor aparece.


Como reconhecê-lo? Outra vez, com atenção e simplicidade.

Observe. Cheire. Sinta.

Perceba se as mãos se encaixam;

Se você ouve fogos de artifício;

Se os olhos se transformam;

Se os silêncios revelam;

E se, dentro daquele abraço, o abraço, é o melhor lugar do mundo.


É simples assim.

No dia em que quiser, de fato, encontrar O amor, vista seus olhos de simplicidade. Naturalmente, ele se revelará. E no seu coração, você simplesmente saberá que ele chegou pra ficar.

Para apreciar

A obra O Beijo, do austríaco Gustav Klint, pintor simbolista, foi feita em óleo sobre tela, em meados de 1907-1908. Klint me recorda e reitera meu palpite de que o amor mora na simplicidade - de um toque, de um beijo.

O beijo. Gustav Klint, 1907.
O beijo. Gustav Klint, 1907.

Para aquela idade na qual o beijo sai de cena, não há problema, pois Klint também pensou nela: observe logo abaixo do beijo, na altura do ombro, onde as mãos se encontram. Ali também mora o amor, na doçura de segurar a mão de quem escolheu segurar uma vida ao seu lado - e não soltou nunca mais.


Para ouvir

Última pista do amor: a anunciação. Preste atenção aos frutos do amor. A contabilidade de quem ama é sempre criativa - de 2 são 3, 5, vários.

Hoje, no Brasil, celebra-se o dia dos namorados, o equivalente ao Valentine's Day americano e europeu. Não permita que as regras, a reserva, o ornamento, o rococó e o paetê encubram o que de fato é. E o que é? Amar é simples.


A data é bonita e pode ser acompanhada de delicadezas. Só não tire o olho, as mãos, daquilo que realmente importa - amar e ser amado, seguir amando, construindo e desconstruindo sentidos, em gerúndio mesmo, enquanto o coração dilata, se rasga e se remenda, e assim, aprende a amar.


Quem se dispõe a amar, recebe do amor o eterno dilatar da alma, que quanto mais se divide e mais ama, maior fica.


Até sempre,

Susan Duarte

Ceo & Founder Zeitgeist iD | A sua marca no espírito da época.

©Copyright 2022 Zeitgeist iD.

 

REFERÊNCIAS

  1. A obra O beijo, de Klint. https://amzn.to/3MOSsLP

  2. No teu deserto, Miguel Sousa Tavares. https://amzn.to/3Ho3lDv

  3. O amor nos tempos do cólera, Gabriel García Marquez. https://amzn.to/3xT8Vui

 


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